Planejar futuros, mirar o passado: ações de educação com indígenas warao e quilombolas na Paraíba

04 maio 2021
O projeto Educação e Oportunidade Indígenas e Quilombolas vem atuando na promoção da educação em duas frentes: uma com a comunidade quilombola Cruz da Tereza (Coremas) e outra junto aos indígenas da etnia Warao que vivem na capital João Pessoa. Com a parceria da União das Comunidades Quilombolas de Coremas (Uniquico) e do Sal da Terra, têm sido desenvolvidas ações educativas contextualizadas, com a participação ativa de educadores quilombolas e warao. Essa ação conta com o suporte financeiro do Instituto Phi.
Atualmente nos concentramos nas áreas de: a) Formação de educadores com povos e comunidades tradicionais e periféricas sobre memórias comunitárias e estratégias locais de enfrentamento de situações de vulnerabilidade; b) Desenvolvimento de estratégias de comunicação e elaboração de materiais didáticos de ampla divulgação, favorecendo vínculos entre o mundo acadêmico e a sociedade na construção de conhecimento e experiências em conjunto; c) Articulação de ações de curto e médio prazo de alfabetização e reforço escolar que possibilitem melhores condições para geração de renda contextualizada.
Um desses grupos que participa do projeto, os Warao, é um povo originário do nordeste da Venezuela, sendo considerado a segunda maior etnia daquele país com aproximadamente 49 mil pessoas espalhadas em centenas de comunidades ao longo do estado de Delta Amacuro. Desde 2014, devido à grave crise na Venezuela, os Warao têm buscado no Brasil condições para sua sobrevivência física e cultural. Os Warao que atualmente vivem em João Pessoa estão alojados em casas/abrigo e uma escola, totalizando ao todo 6 casas/abrigos mantidas através do convênio da Ação Social Arquidiocesana e Secretaria de Desenvolvimento Humano (ASA/SEDH). A partir de um diagnóstico realizado pelo Observatório Antropológico, identificamos um índice de analfabetismo entre jovens e adultos superior a 90%.
A partir de outubro de 2020 foram implementadas pela Sal da Terra, com o apoio do Observatório Antropológico e da Ação Social Arquidiocesana, ações de letramento em português e noções de cálculo entre jovens e adultos Warao, em três das seis residências. Em fevereiro de 2021 o projeto foi ampliado para mais uma residência e a pretensão é que se amplie para todas as residências ainda no primeiro semestre deste ano. A presença desse projeto já proporcionou uma melhora dos índices de leitura e escrita dos indígenas maiores de 14 anos que participam do projeto.
Através do financiamento do Instituto Phi foram ampliadas as atividades para o público infantil, contamos com a colaboração do educador indígena Rafael Rattia que já possuía domínio do espanhol e warao e foi escolhido para construir o projeto para formação com as crianças. O programa para a alfabetização em português possui uma metodologia freiriana que busca estabelecer uma relação de proximidade com a realidade dos estudantes e fortalecer sua identidade e cultura.
O outro grupo que participa do projeto é a comunidade quilombola de Cruz de Tereza, em Coremas, no alto sertão paraibano. No município há um antigo represamento de água para a região que influenciou a organização territorial de muitas famílias negras da região que se deslocaram e foram se assentando nesta e em outras duas comunidades do local. A insegurança fundiária e tentativas de apagamento da presença quilombola são ameaças que as comunidades sofrem ao longo do tempo.
Na comunidade de Cruz de Tereza a atuação do projeto se dá em atividades de reforço escolar, com professores quilombolas que atuam na Uniquico. Com a parceria do Observatório Antropológico em ações de organização, construção de conteúdo pedagógico e formação (que conta ainda com a participação da Sal da Terra), os colaboradores têm desenvolvido metodologias e conteúdos contextualizados para o aprendizado infanto-juvenil quilombola no alto sertão paraibano, com turmas que foram reduzidas para atender normas sanitárias vigentes e com a compra de material escolar e equipamentos que facilitem esses períodos de ensino remoto que estamos vivenciando.
Planejar futuros, mirar o passado é um projeto que busca romper com os processos de exclusão perpetrados contra jovens e crianças em contextos de deslocamento e de disputas territoriais. Romper com a exclusão linguística fortalecendo os laços com o passado e com a história dessas comunidades através de uma valorização daquilo que é digno de ser lembrado é o nosso objetivo. É preciso olhar além, sem deixar tudo que nos permitiu chegar até aqui. Posto que, é justo no lugar de encontro entre o passado e o futuro que está a nossa força. A força que move o nosso presente rumo a um futuro melhor.